quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Cada dia

que passa traz um jogo de luzes e sombras diferente. O frio lá fora esconde o aroma da ternura quente. O frio entre as paredes das novidades chega aos ossos, mas o teu sorriso arma esperança e não arreda enquanto não me contagiar. E cada dia que somamos a uma história insana, mas puramente imperfeita, desponta um sol algures. Uma bolha de sabão mais duradoura, um abraço mais apertado, um amor mais profundo e intenso, uma chama mais brilhante. A sombra esguia de uma maçã na tua mão, o toque inebriante no meu braço, e o sentido de todas as engrenagens que se desorientam no mesmo momento que os ponteiros de todos os relógios param.

que passa é uma soma ardida de números. Ainda assim, sempre assim, é para ti que os ramos fortalezas se dobram. Hoje, mais um número que somas. Mais um dia que te espero. Mais um, de tantos, de poucos e muitos. De asas entrelaçadas, peito aberto ao futuro, negro esfumado ou paleta brilhante. 

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Meu sonho tem boca, que o digam meus olhos ...

... que em todas as horas, houve um tempo sem mentira. Sem nós por desfiar. Permaneço, enquanto bebo as tuas palavras e quase que me engasgo. Eu, que compunha cores pensando que mais ninguém as via, que trauteava melodias que julguei inaudíveis. Eis-me, eu, aqui, sentada à porta dos dias, saboreando a brisa das horas que decorrem entre um abraço e um beijo, entre uma maçã partilhada e um aconchego. Quem sabe o medo é minha cruz, quem sabe o medo é meu motor, quem sabe o medo é luz. 
Encontro a calma, o fumo adensa-se no espírito e flutuo longe, abro a viagem à deriva, estendes-me oceanos de pele para percorrer, enrosco-me no quente do teu peito para sentir o teu coração. Vives. Vivo. 

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

It takes a road to go nowhere ...

Cabes no meu peito. Estendes-me palavras, das tuas, das de outros. E dá-me um acesso de melancolia, de entrar nos teus braços para deles não mais sair. Ponho-me a ouvir o Mestre, A Gente Vai Continuar, e sei de cor quanto vale um beijo teu, uma carícia presa entre fugas. Saboreio essas palavras, O'Neil as diga, tu mas sussurres, e eu que te ame por cada peça que se encaixa.


Há palavras que nos beijam como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas.
Quando a noite perde o rosto
Palavras que se recusam,
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas,
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas,
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte. *

Todo tanto tamanho mundo que encerramos num sorriso. Numa espera que se torna longa por segundos excessivos e travessos. Sabes-me a vida, a cor, a noite, a melancolia segura. A chocolate, a café de aromas, a hortelã, a licor, a saudade, a torradas de manhã, a sumo de laranja, a banda desenhada, a vertigem. És a primeira imagem da manhã, és a última companhia da noite e encarnas o sonho que me vela em cada sono.

És o meu mar. Eu, a tua estrela.


* Alexandre O'Neil
[e tu]

domingo, 19 de outubro de 2008

Entre becos e túneis

Desces com as tuas mãos de luz sobre as minhas pálpebras e o calor invade o meu espaço de terra. Abres a porta do sorriso e pedes que entre, que fique, que conheça e reinvente cada espaço teu. Esse teu espaço que abri sem querer enquanto as cortinas esvoaçavam e eu espreitava.
A minha mão fica, presa ao calendário sem dias, fiel ao teu sorriso e ao teu desembaraço. O corpo segue a alma que se encontrou numa parede e num chão. Ou numa qualquer esquina. Não temos bússolas, mas encontramo-nos num mar de gente. Pelo cheiro, pelo toque fugaz e electrizante, pela pele que nos pertencia sem sabermos.
Tenho sede das nossas noites sem estrelas ...

domingo, 12 de outubro de 2008

sento-me no chão do pensamento, cruzo as pernas e escuto a incerteza ...

Todos os dias aparecem-me umas nuvens no queixo. Umas dores no pulso ou uma cicatriz no umbigo. Todos os dias o meu ego perde brilho.
Desta vez o meu medo tem medo de ser. As horas persistem escuras como tinta esborratada num papel numa linguagem química que talvez Hipócrates entendesse: eu não. E planos e projectos reorganizam-se mentalmente, tento hierarquizá-los, subjugá-los à minha vontade de viver e de aprender o que é, de facto, essa vida, para além das tarefas que nos propomos todos os dias. Que fariam sentido sem sentido. Num longo prazo que é sempre mais curto.
Neste ponto, neste ponto preciso, nada faz sentido e tudo se enevoa na espera de uma data que trará algo. Uma certeza, um aperto, um suspiro, um ombro. Um medo, mas esse já chegou e conquistou para si a casa. Tenho frio. Doem-me as entranhas tal é a violência da espera. Dói-me a língua tal é a dureza das palavras. Dói-me tudo e preciso de tudo para ver uma luz.



(e é de braços descaídos que vejo o sol desaparecer)

domingo, 5 de outubro de 2008

...todos as horas fossem essas...

Parece um brilho que escorre.
Damos por nós a falar num futuríssimo a haver. Cães, gatos não. Enrolados em algodão. A ver o verde a entranhar-se-nos no cabelo e entre os beijos, um dourado lavado a roçar-nos a testa.






Fossem meus os tecidos bordados dos céus,
Ornamentados com luz dourada e prateada,
Os azuis e negros e pálidos tecidos
Da noite, da luz e da meia-luz,
Os estenderia sob os teus pés.
Mas eu, sendo pobre, tenho apenas os meus sonhos.
Eu estendi meus sonhos sob os teus pés
Caminha suavemente, pois caminhas sobre meus sonhos.


(Yeats [and you])






[eu tinha aberto o blogger para traduzir toda a imensidão que trago em mim... esgrimir palavras bonitas e imperfeitas, tentar reproduzir de forma parca toda esta suavidade impetuosa... e chegas tu e atrvessas letras no caminho que percorro ... o meu eu reduz-se a uma contemplação e um sorriso]

Às vezes lembro-me de ter medo ...
tenho um medo não sei do quê.
Penso que as palavras podem pesar,
que os olhos podem cansar e os cheiros desvanecer.
Nessas vezes, sento-me no conhecido canto da escuridão
onde o cheiro a só se entranha
e o silêncio ecoa nas rugosidades da alma.
Restos a persistir na esquina.